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quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Linguajar de lanchonete

O Kibe loco tem razão quando diz que esse pessoal de lanchonete tem um linguajar todo próprio e interno deles. Fui agora na padaria e pedi "um pão na chapa com polenguinho pra viagem, por favor", no que o balconeiro vira e pede:
"Polenguinho chapado viajando!"

Segurei o riso, melhor, tentei.

O faminto


Hoje enquanto estava no ônibus, me peguei pensando em como a gente acaba agindo no automático, fazendo as coisas sem pensar sobre elas, repetir os trajetos rotineiros sem se dar conta, realizar as tarefas do dia a dia sem prestar atenção. Somos capazes de deixar o dia passar e, ao final dele, não conseguirmos nos lembrar das milhares de riquezas de detalhes que passaram na frente dos nossos olhos. Sim, eu juro que esses devaneios ainda tomavam conta da minha mente quando eu desci do ônibus e vi a cena que vi. 
Eu estava mesmo refletindo sobre isso enquanto caminhava rápido em direção à São Francisco Xavier para não chegar atrasada à UERJ. Minha visão periférica capturou um desses moradores de ruas bem magros, preto, sentado em cima de um papelão, sujo, gritando: "Eu to com fome, gente! Por favor, me dá comida!". Essa cena fez parte do meu cenário somente alguns poucos segundos, porque eu caminhava bem rápido. Eu não costumo dar dinheiro para ninguém na rua... geralmente as pessoas pedem dinheiro para comprar comida e a gente sempre presume que eles gastarão o dinheiro para usar drogas. Por isso e pela pressa do cotidiano e pelo medo da violência eu sempre acabo passando direto por essas pessoas. Mas aquele homem não estava pedindo dinheiro, (eu já estava a uns 20 passos dele, com minha cabeça martelando nessa ideia) ele pedia comida. Ele estava com fome e tinha algo no seu timbre de voz que soava desesperado, quase agonizante, o que provavelmente me fará ficar inquieta na minha cama confortável essa noite. Eu não costumo nunca ter dinheiro na carteira, nem reparar nessas pessoas ou ter predisposição a falar com elas, estar perto delas. Mas voltei os 15 metros que já tinha andado decidida que daria alguma coisa de comer àquele homem e quando eu cheguei lá vi o exato momento que uma mulher lhe entregava uma quentinha em suas mãos. "Poxa, ela chegou primeiro", pensei.
Depois descobri: nem é isso que importa. Cheguei à conclusão de que eu me sentiria muito hipócrita de pensar coisas profundas acerca de como as pessoas levam a vida de um "modo automático" se não tivesse tido a coragem de voltar 15 metros para ajudar alguém. 
Eu, de fato, não ajudei àquele homem, mas acredito que ninguém "chega atrasado" para fazer a coisa certa. Se outra pessoa chegou antes de mim naquele mendigo, eu, pelo menos, cheguei a tempo à minha própria consciência. No fim das contas, ajudei a mim mesma a ser um pouco menos mesquinha.

– Priscilla Acioly, 11/11/2013

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Lolita II

Veja só, meu bem
Não vim pra dar sossego
Este rostinho de Maria
Não é pra te fazer rezar
Antes, vai ter que pedir arrego
Depois te ensino a amar

— Priscilla Acioly, 31/10/2013

Lolita

Veja só, meu bem
Minha voz baixinha
Não é pra te fazer ninar
Tudo em mim esconde e tem
Um desejo de excitar

— Priscilla Acioly, 31/10/2013

Movimento

Não entendo 
Como algumas coisas
Vão pra frente
E, ainda assim,
Não saem do lugar
A Terra por exemplo
Está sempre indo...
No entanto, na mesma órbita.

— Priscilla Acioly, 04/11/2013

poison

era nada
surgiu
gotejou
Pingou
JORROU
E s c o r r e u
minguou
sssecou
morreu

y al principio no era nada

— Priscilla Acioly, 07/11/2013

Quando estou 
de óculos escuro 
Me sinto emocionalmente 
blindada
secreta


Posso até chorar

– Priscilla Acioly, 11/11/2013

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

GEMSTONE

I found a gemstone
As you might know,
these kind of stuff costs a lot
But I don't really want to break it
into thousands pieces then just sell it
Its price will never be enough to cover its value
I'd rather save it with me
This gem is too unique to become an average jewelry
I have made up my mind, darling
on keeping its original shape
No bracelet, no necklace, no earrings, no ring
will get in the way
I'll love it that way: gemstone

— Priscilla Acioly, 24/10/2013

Túnel e Horizonte

Meus olhos são túneis
Redondos no fim
Ao sair desses túneis
encontro teus olhos:
deitados

O carro que sai do túnel rumo ao horizonte
Somos eu e você nos encontrando 
Na retina, na pupila, na íris.

— Priscilla Acioly, 06/10/2013

Movimento

Não entendo 
Como algumas coisas
Vão pra frente
E, ainda assim,
Não saem do lugar
A Terra por exemplo
Está sempre indo...
No entanto, na mesma órbita.

— Priscilla Acioly, 04/11/2013

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Ainda não, viu

Um olhou pro outro
Um deles, admirou a cor dos olhos
O outro, reparou nos óculos
Um amou à primeira vista
O outro nem se deu conta

Isso também é a vida: 
eventos que não se cruzam


— Priscilla Acioly, 05/09/2013
Tentando manter os ombros leves
de quem tem 7 anos
O real mesmo: o que você pensa de si.
Envelhecer é involuntário, agir como velho não.

— Priscilla Acioly, 
Dormir é deixar de existir por algumas horas nessa casca ou cápsula dolorosa que se chama corpo.

— Priscilla Acioly
As pessoas parecem pensar que reconhecer os defeitos de alguma coisa requer a completa exclusão de suas qualidades...

— Priscilla Acioly

Um cubo mágico não serve para ficar pronto. No máximo, a gente o monta pra depois desfazer tudo, embaralha-lo novamente e, assim, recomeçar o processo. Um cubo mágico pronto é só uma peça de enfeite, uma vitória estática que não serve para muita coisa além da exibição – exibição essa que depois de um tempo enjoa, entedia.
Um cubo mágico só tem sentido quando desfeito, confuso, inacabado. Aí, sim, existe algum desafio, algum propósito nele.
Acho que a vida é assim. As coisas não podem nunca se encontrar num status de "finalizado", nada é para ser perfeito nessa vida – embora, não se engane, seja nosso dever buscar a perfeição. Se todas as faces do seu cubo estão com as cores combinadas: cuidado. São duas as possibilidades. Ou você caiu numa rotina insuportável na qual reproduz os mesmos erros e acertos. Ou se tornou alguém que não se permite mudar, virou um enfeite.
Talvez o meu cubo esteja quase ficando perfeito... por isso o darei a uma criança de 2 anos para brincar.

— Priscilla Acioly, 09/09/2013

Apnéia

Me deixo sufocar bem aos pouquinhos
Devagarzinho
Aprendendo a respirar com o mínimo

Certo ou errado
Por enquanto é bom

No fim das contas será sempre o sufoco
Ou a asfixia
Porque se eu respirar bem de novo
É porque te esqueci
É porque...


— Priscilla Acioly, 15/09/2013

Aquela

Não dá pra ignorar aquela mulher
E eu escrevo porque as pernas dela são sensacionais
Aquela mulher... 
Ah, não dá

Não quero conhecê-la por dentro, há de ser perigosa
Mas as pernas
Não posso ignorar

Que venha ela correr atrás de mim.



— Priscilla Acioly, 20/09/2013

Eu roubei esse poema

Cheiro de mendigo com árvore
Cheiro de pão
Cheiro de frango assado da padaria

Eu tô na zona oeste do Rio

— Priscilla Acioly, 26/09/2013

Oração por acidente

— Meu Deus! - gritei eu - Socorro!
No que Ele me responde:
— Claro, meu filho. Basta parar de me chamar como mera retórica...

— Priscilla Acioly, 01/10/2013
A gente pode sempre descobrir um novo gosto
um novo cheiro
um novo abraço
um novo beijo

Não tem por que chorar depois de um tempo
se tudo que pode acontecer de pior
é apenas descobrir
um novo amor

— Priscilla Acioly, 19/09/2013

Mulher se escreve com M de marra

Naquele instante fui um grão
Agora sou tonelada
Se escuto a palavra 'não'
Dou logo uma porrada

Ninguém me subjuga mais
Ninguém me dá bofetada
Ninguém me passa pra trás
Nem mesmo diz que estou errada

Sou eu que pago meu pão
Grão, não.
Agora eu sou muita areia pro seu caminhão

— Priscilla Acioly, 01/10/2013

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

GRANDE e eterna estória de amor que durou duas frases


— Linda, decidiu o que a gente vai fazer no sábado?
Ela olhou nos olhos dele cheia de amor e quem ama tem essa mania feia de não prestar atenção nas coisas. Respondeu sem pensar:
— Campeonato de cuspe.
Ele riu.


— Priscilla Acioly, em 24/09/2013

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Bienal do Livro

Às vezes a bienal do livro me lembra um zoológico. Quem admira os livros como quem vai a um zoológico nunca ficou amigo de um personagem.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Ônibus: A Senhora do M&M



Entrei no ônibus que pego no ponto final e fui me sentar num daqueles bancos altos que só os velhos e as criancinhas fazem questão de sentar (ok: os velhos, as criancinhas e eu). Fiquei do lado da janela e logo em seguida uma senhorinha sentou do meu lado, devia ter uns 65 anos.
Um camelô entrou no ônibus pra vender seus doces, muito figura aliás. Enquanto ia lá pra frente cantarolou um corinho de igreja e, antes de começar a vender, saudou a todos com a paz de Jesus Cristo. Achei até que ele fosse pregar mas em vez disso, com um sorriso e um carisma começou a falar dos doces que estava vendendo. 

E lá estavam: os M&Ms

Eu só tinha olhos pra eles. Estavam tão bonitos e eu estava com tanta fome de comer alguma coisa doce... era aquele horário um pouco depois do almoço que você sente sono misturado com vontade de comer besteira, sabe? Mas eu não tinha nenhuma moeda na bolsa justamente pra evitar de comprar essas besteiras. Fiquei ali, namorando aqueles M&Ms triste, cheia de vontade de...
"Aqui, moço". Disse entregando 1 real ao vendedor.
Adivinhem quem era? A senhora do meu lado. Adivinhem o que ela comprou? Exato, o M&M.

E eu juro que naquele momento em que ela pagava o moço e guardava o doce na bolsa me passou pela cabeça em uma fração de segundo o pensamento poxa, ela bem que podia me oferecer mas que foi logo abafado por um para de viajar, garota, ela nem te conhece! E logo encostei minha cabeça na janela e fiquei por uns 20 minutos divagando no trânsito da linha amarela enquanto torrava embaixo do sol. Estava quase pegando no sono quando sinto um cutucão no meu braço. Olhei pro lado e, sem precisar falar nada, apenas com um gesto de mão impulsionando o saco de M&M pra frente e um erguer de sobrancelhas eu percebi que ela estava me oferecendo. Instintivamente eu abri um sorriso surpreso e disse "não, obrigada."

Um pouco envergonhada, virei a cabeça pra janela. Me arrependi do que fiz, eu estava cheia de vontade de comer chocolate, CHEIA! Sem contar que se eu tivesse aceitado, teria sido mais uma experiência inusitada de ônibus pra eu acumular na minha ficha (que nem aquela vez que uma moça ofereceu o ombro dela para eu dormir e eu, vergonhosamente, aceitei. Você pode ler essa história aqui). Foi aí então que eu virei de novo pra moça e disse:
"Ah, pra falar a verdade, eu vou aceitar sim!"
Tentei soar o mais simpática e menos maníaca ou mal educada possível e a senhorinha foi muito autêntica ao responder "Ah, pega mesmo por favor! Eu não posso comer isso tudo... o médico me proibiu" e me encheu a mão, sério ela ENCHEU minha mão de bolinhas de m&m.

E depois ficamos conversando sobre como o trânsito em Jacarepaguá está uma desgraça com essas obras, Eduardo Paes é um safado, Ih, esse tempo não se decide... nem parece que é inverno! Ah, porque meus netos são educados, mas essas crianças de hoje em dia estão muito malcriadas. Você já tem namorado? Tão bonita... quando eu noivei eu tinha a sua idade. Tem que estudar mesmo, hoje em dia se não estudar não vai a lugar nenhum, na minha época era diferente. O ano tá passando muito rápido, não é mesmo? Agora o médico me receitou outro remédio, ando com muita dor nos joelhos... ih, já vou descer! Fica com Deus, querida.

E ali desceu a senhorinha Lourdes. Na verdade, nem sei se esse era o nome dela porque ela não me disse. Conversamos durante 50 minutos e ela já virou minha amiga. Nunca mais a verei... é, nós cariocas somos assim. 

Priscilla Acioly, 02/09/2013



sábado, 31 de agosto de 2013

Quando

só não chegue na hora marcada
só não traga flores
só não diga ''te amo''

só me surpreenda

- Priscilla Acioly, 31/08/2013

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

-

Em algum lugar que eu não estou vendo, as coisas já estão dando certo. De alguma maneira, Deus já fez... Ele só decidiu não me mostrar ainda.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Acontece aqui em casa - cap 1


Minha mãe e meu pai na sala trocando farpas por causa dos seus times. 

Ela, flamenguista. Ele, botafoguense.

Mãe: Esse teu time aí sem graça, ridículo... só tem velho.
Pai: Você nem é flamenguista de verdade, é uma alienada. Nem gosta de futebol.
Mãe: Num gosto mesmo, e daí? Mas sou flamengo, ué. É o mais animado... e esse teu time aí de boiola? Todo botafoguense é viado...
Eu: Não, mãe! São os tricolores... tu nem conhece os estereótipos, pô.


terça-feira, 20 de agosto de 2013

O cara que dormia no ônibus


Eu tenho dezenas de crônicas de ônibus inimagináveis para contar. Mas hoje (aliás, acaba de acontecer) ocorreu, de fato, algo surreal. 

Ônibus: 353. 
Por volta das 21:30 o ônibus está passando por Quintino quando o motorista dá uma parada brusca. Fico até preocupada, mas então vejo que o motorista está esperando acontecer alguma coisa até que, quando se dá conta de que a tal coisa não acontece, levanta e dá a ordem: senhora, chama o cara aí do meio. 
Eu e mais todo o ônibus viramos a cabeça pra olhar o cidadão que estava dormindo nos bancos. A moça o chama, ele não acorda. O motorista chama ele quase aos berros "Anda, cidadão! Levanta!" e ele nada, apenas solta uns resmungos. Eu não estava entendendo direito o que estava acontecendo. Até cheguei a pensar que o homem estava chapado.
O motorista irritado pula a roleta (essa parte foi sensacional, ele realmente pulou a roleta com fúria), vai até o homem e o cutuca "você tem que descer, já estamos na FAETEC" ao que o sujeito responde ainda dormindo "não é esse ponto, não". O motorista se indigna, faz ele acordar na marra. Este se levanta ainda um pouco desnorteado mas, enfim, reconhece seu bairro e desce do ônibus com duas enormes sacolas de não-sei-o-quê (seu aparato de trabalhador e, se não for, eu, como escritora, digo que é). No que ele descia, o motorista praguejava "Dormindo assim não dá, todo dia a mesma coisa ter que ficar te acordando! Agora se eu te ver no ponto num vô mais pegar".
E eu aqui, no primeiro banco do ônibus, embasbacada com a cena. Um motorista que sabe onde o passageiro tem que descer... parece mentira. Inclusive, isso tinha que ser mentira. Se algum de vocês me contasse essa cena eu não acreditaria. O problema é que não é ficção... Ah, não é...
É o Rio de Janeiro e seus personagens caricatamente reais da Zona Norte.

Crônica de Pai


Pai e filha conversando dentro do carro.

Por meu pai ter nascido numa família muito humilde, nunca havia me ocorrido como ele conseguira chegar a ser gerente do, então na época, Unibanco. 
– Pai, quem te colocou pra trabalhar no Unibanco? Você fez prova pra entrar lá?
– Entrei lá como office boy, vi que tinha uma vaga e me candidatei.
Incrível, mais de 20 anos e eu nunca soube como meu pai tinha começado a história dele, pensei.
– Aí eu fazia de tudo lá dentro, e um dos gerentes chegou pra mim e disse "Aqui dentro office boy só fica 6 meses. Se nesse tempo você não aprender a fazer tudo que os outros fazem aqui, vai ser mandado embora. Tem que crescer."
– Mas e aí, pai?
– E aí que eu não sou trouxa. Quando me perguntavam se eu sabia fazer alguma coisa eu nem hesitava, dizia que sim mesmo que nem tivesse ideia de como fazer. Um dia meu chefe perguntou se eu fazia usar a máquina de escrever. Levei uns documentos pra casa, passei a noite toda para fazer aqueles relatórios, nunca havia mexido em uma.
Eu ri. Adoro isso no meu pai, pra ele não existe "não sei", existe "me dá que eu faço" (não é à toa que minha mãe e minha vó o apelidaram de MacGyve).
E aí vocês já podem imaginar, de office boy ele virou auxiliar administrativo, depois outro cargo um pouco superior até que, enfim, gerente. E ficou lá por 22 anos, agora trabalha como taxista no aeroporto.
O que mais me orgulha nele é sua inteligência prática, o jeito sagaz. É rápido de raciocínio. 

Essa conversa com ele no carro me ensina muita coisa e me inspira na minha própria caminhada. Vale mais do que uma troca de "te amo".
E nós temos sorte de tê-lo aqui em casa.

por Priscilla Acioly, 11/08/2013 
(homenagem do Dia dos Pais)

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Marcha das Vadias: um episódio à parte






Vou partir do pressuposto de que se você chegou até esse artigo é porque já conhece o movimento Marcha das Vadias. Portanto, meu objetivo aqui não é falar a respeito da marcha em si, nem sobre minha opinião a seu respeito – ainda que eu acabe o fazendo. Entretanto, se você caiu aqui de para-quedas ou por mera curiosidade aconselho que se informe sobre a Marcha das Vadias para não cair na tentação de julgar precipitadamente e eliminar os pontos positivos da Marcha que poderia ter encontrado, caso você tivesse se aprofundado melhor no assunto (pesquise: http://pt.wikipedia.org/wiki/Marcha_das_Vadias).

Esse é um artigo de opinião. Desse modo, você vai esbarrar aqui, caro leitor, com ideologias prévias, cultura, conhecimento de mundo e, consequentemente, com a opinião particular (embora dialogicamente construída, ela tem consciência disso) da autora – no caso eu. Devo admitir que aqui me debruço mais por um teimoso exercício da escrita, confesso – uma pretensão de ajustar e aprimorar o meu poder de argumentação –, do que para expor, de fato, um acontecimento que já está sendo narrado, descrito e comentado incontáveis vezes pelas redes sociais adentro. Postas as devidas considerações, chega de introdução e vamos aos fatos (ou, devo dizer, às considerações dos fatos?).

Para começar, devo deixar algo bem claro logo de início: sou a favor de qualquer iniciativa que proponha um mundo no qual as mulheres tenham os mesmos direitos que os homens. Como disse o Papa Francisco "Un joven que no protesta, a mi no me gusta". Sou a favor que as mulheres saiam às ruas e postulem para si o direito de se vestirem como bem entenderem sem que isso signifique dar "margens para um estupro", aliás, esse foi o estopim e o mote para que surgisse a Marcha das Vadias. Não tolero, e quero sublinhar isso, que um ato de estupro possa ser justificado pela roupa da vítima, e nesse ponto estou rigorosamente de acordo com a Marcha. O problema não está na vítima, não pode estar. As mulheres precisam ter o seu direito garantido de usarem as roupas que assim desejarem. O que for contra isso é sexismo. E eu deixo de fora a questão da moral (o que é certo vestir, o que não é, o que é muito provocativo etc) porque aí já não falamos de uma questão pragmática, mas filosófica. 


Eu, Priscilla, não sou feminista (pelo menos não assumidamente) e tampouco poderia me declarar uma, visto que acompanho o movimento apenas de longe, sem nunca ter estudado suas causas a fundo. No entanto, isso não significa que eu não simpatize com algumas causas do movimento feminista e não deseje que o mundo seja um lugar onde homens e mulheres gozem uma vida civil em que seus direitos e deveres sejam iguais. Como mencionei anteriormente, a Marcha das Vadias tem seus aspectos positivos. Porém, quero falar de um episódio à parte...


Preste atenção agora, pois daqui em diante estará o verdadeiro assunto do post (enrolei vocês esse tempo todo, rs). Li uma notícia hoje que me deixou, no mínimo, perturbada. E é sobre ela que quero falar. Para não tornar tudo repetitivo e lento, prefiro que você mesmo leia a notícia que está aqui

Leram? Pois bem, eu fico intrigada com ações como essas. O que essas mulheres e homens tentam provar para si mesmos fazendo o que fizeram? Não consigo enxergar tais ações como protestos, nem ao menos com caráter performático/artístico. Acho curioso, porque batem tanto nos evangélicos (e com razão) na questão da intolerância religiosa. Quem não se lembra daquele infeliz pastor que chutou uma santa em rede nacional (ver aqui)? Querem saber de uma coisa? Eu não consigo perceber diferença entre o que aconteceu na Marcha das Vadias no tal episódio mencionado e o que esse pastor fez. Para mim, ambas as atitudes são terrorismo religioso. Ambas são fruto da ignorância, da falta de respeito para com o outro cidadão. Quis ser muito cuidadosa ao intitular este artigo por "Marcha das vadias: um episódio à parte", pois achei importante destacar que esse ato polêmico de simular relações sexuais com crucifixos e quebrar imagens foi de um GRUPO. Ou seja, não posso e nem quero transformar esse episódio à parte numa relação metonímica e, assim, deslegitimar todo um movimento, onde mulheres sérias estão comprometidas em conclamar aquilo que acreditam ser ideais para uma sociedade mais justa. 


Ainda que eu discorde em vários pontos sobre as reivindicações que a Marcha das Vadias fazem, a questão não é essa. A questão é que eu rogo a essas mulheres que tenham pulso forte para saberem protestar de maneira inteligente – como eu sei que podem – sem que, para isso, seja preciso ofender a fé das pessoas. Eu gastei centenas de minutos escrevendo esse artigo, apenas para fazer um apelo: Que mulheres e homens não parem de pedir um mundo mais justo. E que, na busca de seus ideais, não atropelem o ser humano que está logo adiante. Gosto muito de uma palavra africana: ubuntu. Mais que uma palavra, é um conceito difícil de ser traduzido, significa mais ou menos "sou o que sou pelo que você é". 

Estamos todos, de fato, de alguma maneira interligados. E eu lamento, mas o que aconteceu nesse episódio isolado é lastimável, desprezível eu diria... perdoem-me. Mas equiparo atitudes como essas a atitudes de evangélicos que não toleram outras religiões e que corretamente recriminamos. (E pego o exemplo dos evangélicos não por que tenha algo contra eles, exatamente pelo contrário. Sou cristã protestante, então me sinto num terreno muito à vontade ao apontar os erros do segmento que eu mesma faço parte.)

Será que vale a pena protestar, se não se está baseado na razão? Tenhamos cautela para que nossos protestos não sejam motivados apenas por uma paixão (pathos) cega.  Do contrário, nossos protestos podem estar, por vezes, incitando o discurso do ódio, que tanto desaprovamos.


Por Priscilla Acioly.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Protestos no Brasil em Junho de 2013

Postei isso no meu facebook e achei que seria legal deixar registrado aqui.




"Agora eu posso falar: a esmagadora maioria não é de vândalos como querem pintar. O episódio da alerj, apesar de lamentável, é fato isolado. Eu estava lá no meio da manifestação e preciso dizer a vocês o que vi: seguramente mais de 100 mil jovens caminhando, pacificamente, gritando em alto som pelo transporte, pela saúde e educação. NÃO ACREDITEM NA MÍDIA, eles desviam o foco. Foi lindo, me arrepiou ver a multidão cantando o hino nacional. Me comoveu cada segundo estar no meio daquelas pessoas, gigantes pela própria natureza.
Eu não estava aqui na época da ditadura pra saber como era. Não, tb não estava ma era Collor. E se reclamavam, com razão, da nossa juventude apática, eu digo a vocês: Saímos do facebook. Ganhamos as ruas."
#ogiganteacordou


17/06/2013

A Porta



Bati de vez
Porque lá fora só passa essa brisa, indecisa
Coisas leves, não as quero
Só abro a porta quando passar um furacão
Só abro a porta quando passar
Você

– Priscilla Acioly (27/06/2013)